terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Capítulo 01

         Essas mãos amarelas que aqui escrevem, já foram fartas e saudáveis. Já estiveram sob a luz de muitos holofotes, de muita pompa e honra. Hoje, um velho ator, procurando algum pouco de sol, no meio de tantas nuvens.
         Meu nome é Donival Leite Silva, vê-se logo que não é meu nome artístico. Com um nome desses, jamais teria conseguido um papel de árvore nas peças da escola. Hoje uso meu outro nome, Donival Salazar. Mantive o Donival por que não conseguia me acostumar com Marcos, Miguel, Ignácio ou Allan.
         Eu tinha 15 anos quando comecei a atuar. Fiz muito sucesso, muitas peças, alguns filmes, algumas novelas. A arte não seria a mesma sem mim, Donival.
         Eu não sei falar do meu início, então vamos falar do presente, com alguns toques no passado.
         Olhem, hoje eu fui a 1 emissora e liguei para dois teatros, e sabe, eles não tinham nada que fosse do meu tamanho e glória. Eu não quis nem saber de papel de vovó. Ter 68 anos não quer dizer que eu não possa ser protagonista. O que mais me machuca é eu não ser o dono da minha própria história.
          Eu conheci uma mulher, quando eu ainda era jovem e famoso, o nome dela é Maria Tereza, nós tivemos um relacionamento de uns 8 meses. Ela não era pra mim. Não tinha pose e glória. Não tinha nada, se não amor. E eu a amava, mas minha vaidade sempre fala mais alto, e terminei tudo com Terezinha. Foi um chororô dos dois lados, mas meu ego que estava cego, me fechou por todos os lados. Passados os dias, descobri que Terezinha era se não, filha de um grande empresário, muito rico, muito rico mesmo, e que havia fugido de casa, por que estava apaixonada por mim, quer dizer, pelas minhas fotos. Ela arrumou um emprego na produção da minha peça, e começou o flerte. E depois de 8 meses e meio, veio a notícia de que eu seria pai. Eu me casaria com Maria Tereza Phorfiet Parreira Seinsal, e estaria de novo em mais evidência. Eu era um tolo em aceitar, mas na época eu ainda a amava. Ao anunciarem o casamento, o nome de Terezinha sempre era maior que o meu, e isso me cortava o coração, quer dizer, o narcisismo. Depois, o nome da criança veio em primeiro lugar. E eu era só o pai. Não era mais o ator, o protagonista, não. Foi ai que tudo começou a despencar.
           Quis ser o favorito de meu sogro, Hilário, mas sem sucesso. Ele julgava que minha profissão não era digna, e que eu tinha que trabalhar em uma de suas filiais. Era uma guerra dentro de mim. Ou eu abocanhava aquela oportunidade, e sumia das telas e palcos, ou era marginalizado até a ultima gota de sangue. Qualquer um teria uma escolha que não foi a minha.
- Não vou, Terezinha.
- Por que não, Donival?
- Olhe bem, eu tenho ainda muita coisa nos palcos... eles me querem. Eu não posso deixar que o Brasil padeça sem minha presença. Não posso.
- Por que você é tão egoísta? Não pensa em mim, nem na nossa filha, que a propósito, nem nome ainda tem.
- Tereza, calma. Preciso pensar em um nome de destaque, afinal, ela é minha filha. Bem, você já tem quem pense em sua vida, agora e eu? Vou viver esquecido sob a sombra de seu pai? Nunca.
- Faça o quiser, mas, por favor, não nos prejudique. Engraçado, você não gosta de ficar sob a sombra de ninguém, mas aceita receber humilhações diárias, só para viver nesta casa.
         Terezinha ainda me amava demais, mas ela vinha ficando muito doente, e nossa vida na casa dos pais dela foi alarmando, e chegando a um ponto em que eu não aguentava ser humilhado, nenhuma riqueza podia fazer com que Donival Salazar se abaixasse. NÃO.
          Em poucos dias, estávamos de mudança, a contra gosto do resto do mundo, mas íamos para meu antigo apartamento. Eu iria voltar aos palcos, Tereza ia cuidar da criança. Ótimo para todos. Não tinha erro. Só que as peças já tinham fechado contrato naquele semestre, e eu não queria qualquer papel de ultima hora, precisava mesmo era de destaque. Tereza adoeceu mais, e mais e mais, até que não foi mais possível mantê-la sob minha custódia, e levaram-na para um hospital. Os pais estavam furiosos, e não deixavam que eu a visitasse. A menina ficou, e ela ainda não tinha nome, mas Tereza deixou um papel dizendo que o nome da criança seria Adalgisa Phorfiet Parreia Seinsal Leite. A mim coube só um sobrenome, mas o que se há de fazer se o único que me vale é Salazar, e não é meu de direito. Registrei-a assim, mas nas capas das revistas e nos jornais, chamavam de Adalgisa Phorfiet Salazar, filha de Donival, neta de Hilário e Dona Guirdes, herdeira. E meu nome veio a tona mais uma vez, sob a sombra de Ada.
          Não fui conseguindo trabalho, e as contas para pagar. Tive que aceitar qualquer coisa, por que a criança que já estava com 1 ano e meio, precisava da babá, que eu não conseguia pagar. Fazia um ano que eu não tinha uma notícia de Terê. Pressupus que ela havia morrido. Triste admitir. Porém, por que o avó e a avô não procuraram por Adalgisa? Talvez quisessem tirá-la de minhas mãos, seria até mais agradável. Minha primeira ruga nasceu quando Adalgisa fez 2 anos.
           Em uma publicação de um jornal, lia-se: ''Maria Tereza Phorfiet chega da França'', e uma foto enorme e linda de Terê de um jeito que eu nunca vi, parecia uma princesa. Larguei a peça e fui até Minas Gerais, onde os pais dela moravam. Peguei Ada também, e fomos, tirar uma satisfação. Cheguei na casa do velho Hilário, e lá estava Terê no jardim, com a mãe, as duas conversavam. Estava realmente linda. Eu me anunciei, e deixaram-me entrar, eu e Ada. Chegando lá, a conversa foi longa, e muito pessoal para escrever aqui. Os pais dela não queriam que ela se arruinasse comigo, por que diziam que eu era homem de várias mulheres. E era mesmo. Mas nesse meio tempo as várias mulheres cuidaram muito da neta deles, oras.
            Mª Tereza quis me obrigar a findar minha carreira, sob ameaça de difamar meu nome, e eu não arrumaria mais nada. Botariam homens para me vigiar, e acabar com qualquer emprego que eu tivesse. Quis xingá-la, mas não pude, os pais dela estavam no recinto, e era ideia deles esse disparate.
            Era agora eu, Donival Leite Silva, gerente, casado, pai. Só.
            As estrelas se apagaram naquela noite, foi lua nova. E o inicio de um martírio.